quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Mário Quintana, o homenageado da primeira Jornada

Em 30 anos, muita coisa muda. Isso se aplica à maioria das pessoas e coisas na vida, inclusive às Jornadas de Literatura de Passo Fundo. Em sua primeira edição, tinha um porte muito menor que o atual: Intitulada I Jornada de Literatura Sul-Rio-Grandense, era focada exclusivamente na produção literária do estado gaúcho. Tanto isso é verdade que o mote principal da programação de 11 a 15 e agosto era “Uma análise da mais pura expressão cultural sul-rio-grandense”.

Nesta época, intercalavam-se três atividades: conferência individual dos escritores, debate com o público e debate entre escritores. Além disso, para último dia estava prevista uma homenagem para os convidados. Um time de estrelas da pena foi escalado para esta reunião inaugural: Antônio Carlos Resende, Armindo Trevisan, Carlos Nejar, Cyro Martins, Deonísio da Silva, Josué Guimarães, Moacyr Scliar, Sergio Caparelli. Além destes nomes todos, um já nacionalmente reconhecido poeta, Mário Quintana, foi também convidado, na condição exclusiva de homenageado. Entretanto, às vezes nem tudo o que está no protocolo transcorre como programado; isso fica claro em mais um relato da professora Tania Rösing, extraído do primeiro volume do Anedotário da Jornada, que você pode ler abaixo.


Homenagem ao poeta

Na primeira edição sul-rio-grandense da Jornada, em 1981, Josué Guimarães convidou o grande poeta gaúcho para participar do evento. Aos 75 anos, o mais querido poeta do Rio Grande do Sul estava muito lúcido, mas não tinha disposição para ministrar uma conferência. Dispôs-se a vir com Josué e Nydia para responder a perguntas, dar autógrafos.

Havia uma grande expectativa em torno da chegada de Mário Quintana.

Nos primeiros anos da Jornada, as refeições – almoço e jantar – eram realizados em minha residência. Meus familiares recebiam os convidados com muita alegria. No almoço, era oferecida comida típica da região serrana intercalada com saboroso churrasco. À noite, a saudosa Dona Olívia, a preta boa, a preta sempre de bom humor, que certamente está no céu – “Entra, Olívia, você não precisa pedir licença!” – comandava o jantar.
A homenagem a Quintana estava prevista para a manhã do sábado. Durante o jantar da sexta-feira, o poeta, por volta da meia-noite, serviu-se de cinco bananas à milanesa. Traçou uma a uma. Fiquei apavorada. O que poderia acontecer? Não morreria antes da homenagem?...
Na manhã de sábado, dirigi-me ao Turis Hotel. Seria uma manhã inesquecível certamente: o encerramento da Jornada e a homenagem a Mário Quintana. Todos aguardavam no saguão do hotel menos o poeta. O tempo foi passando, passando... Ninguém havia visto Quintana no salão de café. Pensei nas bananas... tão tarde... Teriam-lhe feito mal? Meu Deus, teria morrido?...
Nydia, muito amiga do poeta, foi até o apartamento. Precisava saber o que estava acontecendo. Ficamos muito apreensivos. Nydia também não voltava...
Quintana vestira seu único terno e fora até a pia para lavar os dentes. Abrira a torneira, abirira mais um pouco até desrosqueá-la. Um jato grande de água atingira-o, molhando sua roupa por inteiro. Não sabia o que fazer, pois não tinha outra. Nydia pediu-lhe que tirasse a roupa e esperasse debaixo dos lençóis e das cobertas. Estava muito frio. Enquanto isso, procurou um ferro elétrico para secar o terno e a camisa encharcados...
Quase vinte minutos depois, chegaram ao saguão Nydia e Quintana. Ele estava com um sorriso de moleque que lhe era peculiar. Ninguém falou nada. Dirigimo-nos ao Salão de Atos do prédio da Antiga Reitoria. Uma multidão impaciente, mas muito feliz, aguardava o poeta. Foi aplaudido de pé.

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